quinta-feira, 1 de outubro de 2015

O trabalho do designer é profissional, mesmo que o mercado seja amador


O design gráfico nasce no capitalismo. A revolução industrial, a produção em série e a criação de mercados consumidores, fez nascer a necessidade do design gráfico. O design gráfico só existe porque a sociedade consumidora se desenvolveu nos países industrializados. Nosso papel como designer é deixar vivo o capitalismo. Manter a chama do mercado sempre acesa. Por isso que o design gráfico é um indicador de desenvolvimento econômico de uma sociedade.

Essa ideia não é nenhuma novidade. Fábio Mestriner, no livro "Design de embalagem", fala a mesma coisa, mas referindo-se só ao design de embalagem, "A embalagem hoje é um importante componente da atividade econômica dos países industrializados, em que o consumo deste item é utilizado como um dos parâmetros para aferir o nível de atividade da economia." (2002). Depois que alguém explica, a coisa fica óbvia. Se o design é um instrumento de desenvolvimento do capitalismo, quanto mais design existe numa sociedade capitalista, mais desenvolvida economicamente ela é.

Essa análise pode ser global ou local. Quando levamos em consideração uma empresa ao invés de um setor inteiro, por exemplo. Quando um empresário entende a importância de um profissional de design gráfico para o desenvolvimento de sua empresa, é porque ele está no nível muito mais avançado de desenvolvimento comercial.

A literatura de Marketing traz a noção clássica de "composto de marketing", que seriam os elementos mais fundamentais de uma organização comercial (de qualquer tipo). Esses elementos precisam estar muito bem estruturados, para que o negócio caminhe rumo ao sucesso. O composto é divido em "Ps". Produto, Preço, Praça e Promoção. Cada um deles abrange uma série de questões, tais como política de preços, canais de distribuição, qualidade, marca registrada, embalagem, rotulagem, etc. O design gráfico está envolvido com o "P" de promoção. Junto com a publicidade, é o design gráfico que vai fazer chegar até o consumidor o nome da empresa. Nessa perspectiva profissional de mercado, o design gráfico é tão importante para o sucesso de uma empresa, quanto a logística ou o próprio produto. Deixar de lado, ou em segundo plano um dos "Ps" é enterrar o futuro da empresa no buraco do fracasso.

...o design gráfico é um indicador de desenvolvimento econômico de uma sociedade.

Uma empresa que entende a importância do Designer, é a empresa que já tem os seus fundamentos muito bem estabelecidos no mercado que atua. Pra entender a necessidade de uma boa fundação - na construção civil, por exemplo, uma boa fundação faz com que os prédios sejam sólidos, quanto melhor a fundação, maior e mais resistente é o prédio. Quando a fundação é bem feita, o limite para o crescimento (do prédio ou da empresa?) é o céu.

Um empresário que acha caro o trabalho do designer não precisa de um designer. Com certeza a empresa dele precisa muito mais de um administrador. Com certeza a empresa dele precisa de alguém que resolva problemas de caixa, de fluxo, de balanço, problemas de base. Um empresário que não entende a importância do papel do design gráfico na vida da sua empresa, com certeza ainda tem problemas básicos de administração na sua empresa.

Um empresário que não entende o valor de uma boa usabilidade no seu site, de uma harmonia cromática em sua identidade visual, da ergonomia na sua embalagem, da clareza de sua sinalização, ou no ritmo de leitura do seu material gráfico, ainda não é um empresário, ainda está no amadorismo. A empresa só sai do amadorismo quando ela cresce, quando a ela é permitido o desenvolvimento.

O empresário amador não sabe e não entende o poder do design

O que muitas vezes tenho visto acontecer são mercados inteiros ainda imaturos. Mercados baseados no amadorismo empresarial. O empresário amador não sabe e não entende o poder do design. Não consegue ver a relação direta entre o "P" de promoção e o desenvolvimento da sua empresa.

Mas o pior mesmo é quando o amadorismo ainda está no próprio design gráfico. O profissional do design que se comporta como amador vive pra sempre sem entender a própria função. E eu não estou aqui falando do "micreiro"ou do "sobrinho", se você é designer e acha que o "sobrinho" é seu concorrente, amigo, está na hora de você rever seus conceitos. A empresa que procura o serviço amador de um "sobrinho" não precisa de um designer, porque ela ainda é amadora. O objetivo do trabalho do designer é PROFISSIONAL. Mercados amadores não estão prontos para o design.

Quando você vê uma sociedade que não valoriza o papel do design gráfico, você está diante de uma sociedade que precisa evoluir economicamente. As regiões do Brasil que tem, por exemplo, desenvolvimento industriais muito avançados, tem um mercado de design gráfico a pleno vapor. Com escritórios internacionalmente premiados, com profissionais valorizados.

A valorização do profissional de design reflete o desenvolvimento econômico de uma sociedade.

sábado, 21 de março de 2015

O beijo gay, a bicicleta e o brasileiro médio

Beijo gay das personagens de Fernanda Montenegro e Nathália Timberg 


O brasileiro não sabe o que é direito.

Tá, não vou ser tão radical assim... O brasileiro tem uma visão distorcida do que é direito.

Não, ainda está generalizando demais... O brasileiro médio tem uma definição deturpada do que é direito.

Acho que é isso.

Quando eu falo brasileiro médio, não estou falando em classe social. O brasileiro médio é aquele que tem argumentos que não vão além do próprio umbigo, e pra isso, pouco importa a classe social ou a situação financeira. Também não estou falando do Direito (com letra maiúscula) que é a definição da ciência do direito, esse campo o brasileiro conhece muito bem, afinal, de um tempo pra cá, cada vez mais o Direito está acessível a todos. Eu falo do direito, aquele que é primo-irmão do dever na nossa constituição. Falo da faculdade de uma pessoa mover a ordem jurídica pelo seus interesses. Essa última definição ainda é muito obscura na cabeça do brasileiro médio.

A democracia no Brasil nunca foi adulta, ela já morreu várias vezes na nossa história e sempre morreu jovem. Quando ela renascia era sempre na figura de uma criança frágil, que precisava ser cuidada para crescer forte e saudável, o problema é que na maioria das vezes mandaram a democracia, ainda adolescente, para o exílio. Se o brasileiro não é íntimo nem da noção de democracia, imagine do direito.

Foi assim desde o embrião do nosso país. Quando a Família real veio fugida para o Brasil, aqui já não existia democracia nenhuma. A última coisa que um Estado escravocrata poderia ser, era democrata. No entanto a mudança da família real e de toda a corte portuguesa foi de verdade o início desse sentido deturpado de democracia e do direito. A figura da nobreza no Brasil, fez com que uma nova classe entrasse na dinâmica social existente. A família Real exigiu privilégios que eram inerentes à nobreza. A partir daí a noção de direito para o brasileiro passou a ser atrelado a uma classe social. A nobreza tinha mais direitos que o resto da população, garantidos principalmente pela herança de sangue.

O problema é que nesse meio tempo, a família real percebeu que cá, diferente de lá, além de sangue azul, era preciso ter riqueza, e as posses principais dos nobres e fidalgos tinham ficado lá do outro lado do atlântico, largados as pressas. A solução mais fácil para a corte portuguesa foi vender títulos de nobreza. Assim ganhavam todos os cidadãos, quem tinha sangue azul conseguia manter seus privilégios, e quem tinha o dinheiro ascendia socialmente ganhando novos direitos. O resto da população não entra nessa equação, afinal, não tinham direito a nada, não eram cidadãos.

A noção do direito acabou mudando, agora no Brasil, para ter privilégios bastava ter dinheiro, pouco importava se seu sangue era azul, vermelho ou de barata. Nesse contexto, a situação ficou insustentável para a nobreza, mesmo barganhando com os donos do dinheiro e berrando às margens do Ipiranga, não teve jeito, tomaram um belo e merecido chute na bunda.

Os republicanos assumiram o poder, quer dizer, só mudaram o nome do jogo, afinal eles já mandavam no país, bem antes de qualquer proclamação. Foi uma transição pacífica, pra quer brigar num jogo de cartas marcadas? Ou seja, todo o status quo do império continuou existindo, não houve nenhuma mudança social significativa com a proclamação da república brasileira.

No meio de toda a herança social do império veio a noção deturpada do direito. O povo brasileiro passou a entender direito como privilégio, e privilégio não é pra todo mundo, o direito é. Essa noção deturpada se entranhou em todos as classes sociais, independente de que tem posse, ou de quem é possuído.

Seja rico, classe-média ou pobre a ideia de "direito = privilégio" existe. Na república velha os direitos ou privilégios eram dos grandes proprietários de terra, só os filhos deles tinham direito ao ensino superior, por exemplo. As pessoas achavam isso absolutamente normal, afinal, se eles é que tinham dinheiro, então todos os privilégios/direitos a eles.

Esse sentindo deturpado do direito se perpetuou na sociedade brasileira. E o pior, agora não é mais ligado só ao sentido de posse, hoje em dia as pessoas exigem seus direitos/privilégios baseados em questões como religião, gênero, opção sexual, raça, etc.

Por isso é tão difícil para as minorias alcançarem ganhos de direitos civis no país. Porque o brasileiro médio acha que dar direito a outras pessoas, que não seja ele, é tirar seus privilégios. Por isso é tão difícil um beijo gay na novela das 21h. Porque o brasileiro médio acha que expressão de amor é um direto/privilégio somente dos heterosexuais. Qualquer tentativa de igualar os direitos é dar privilégios aos gays, automaticamente tirando dos héteros. O brasileiro médio não consegue entender o sentido de direito universal, pra ele, direito é privilégio, e privilégio é pra poucos.

O mesmo está acontecendo com os ciclistas em São Paulo. Qualquer política pública de incentivo ao uso das bicicletas, é vista pelos motoristas (a maior representação proporcional do brasileiro médio) como uma perda de privilégios. Para esse ser de pensamento obtuso, uma ciclofaixa é um roubo do seu privilégio de andar com seu carro na rua.

Ciclofaixa na Av. Paulista. créditos: Oswaldo Corneti/ Fotos Públicas
Por isso é tão difícil aprovar uma lei que regulamente a adoção de crianças por casais homossexuais, ou mesmo regulamentação de uniões homoafetivas. Porque pro brasileiro médio, família é um privilégio de poucos. Quem for diferente dele, não tem direito, afinal, direito é privilégio, e privilégio é pra poucos.

O mais preocupante de tudo isso é que nesse cenário, pouco adiantam as políticas públicas, elas sempre vão ser rejeitadas, porque, infelizmente, além de resistente, o brasileiro médio é numeroso.